Ontem anoiteceu em pleno dia: um corredor de fumaça foi formado por queimadas na Amazônia, e virou noite em São Paulo, no litoral e nos Vales do Ribeira e Paraíba.
No sudeste chegou somente na segunda, mas Rondônia, Manaus e o sul do Amazonas estão em estado de emergência desde o começo do mês.
Foto de Araquém Alcântara
Entre julho e setembro as queimadas são intensificadas: estamos no verão amazônico, quando é mais quente e seco. Existem, sim, algumas queimadas autorizadas pelos órgãos responsáveis (federais e estaduais), que são pequenas e controladas, usadas para conter fogo ou fazer manejo de uma vegetação – mas nunca nesta época do ano pelo perigo de alastramento. Existem também queimadas naturais, causadas por raios em tempos de seca. Mas, segundo especialistas, o que estamos vendo é por causa da ação humana – ilegal.
Biomassa em chamas nesta terça-feira dia 20 de agosto de 2019
Esta é a maior alta dos últimos sete anos e diversas regiões do Brasil sofreram com o desmatamento da Amazônia. Mato Grosso, Pará, Amazonas, Tocantins e Rondônia já tiveram milhares de focos de incêndio este ano: no total são 72.843 focos, 83% a mais do que no ano passado.
Provocar queimadas é crime, por poluir em forma de fumaça, causar riscos de incêndio para habitações, destruir vegetação e causar a morte de animais.
Além da fumaça carregada de CO2 (gás do aquecimento global) e fuligem, e da perda da mata nativa, os animais silvestres e também cativos estão morrendo queimados, sufocados com a fumaça ou atropelados tentando fugir do fogo. Vôos estão sendo desviados pela baixa visibilidade. Nas regiões afetadas os pronto socorros estão lotados de pessoas que não conseguem respirar, e os bombeiros já atenderam 900 ocorrências em 60 dias e só têm unidades operacionais em 15 dos 52 municípios.
Comparação da média de 2013-2018 para 2019 no estado de Rondônia
Comparação da média de 2013-2018 para 2019 no estado do Amazonas
E esses efeitos são levados pelo ar para diversos países: o vento da Amazônia corre de leste a oeste, e quando encosta na Cordilheira dos Andes e não consegue passar desce passando pelo Peru, Bolívia, Paraguai, Brasil, Uruguai e Argentina.
A Amazônia é a maior floresta do mundo, e se estende por 9 países. Possui o maior rio do planeta e os maiores aquíferos. Florestas capturam 30% do carbono que nós humanos produzimos. É lar de cerca de 2,5 milhões de espécies de insetos, dezenas de milhares de plantas e cerca de 2 mil aves e mamíferos e só no Brasil há uma média entre de 96 mil e 128 mil espécies de invertebrados e um quilômetro quadrado da floresta amazônica pode conter cerca de 90 mil toneladas de métricas de plantas vivas.
Nossa atmosfera é uma só: a poluição de um local afeta todos os outros, e estamos vendo isso com os próprios olhos. Os animais que vivem aqui não existem em outro lugar. As águas doces que temos não são eternas. O progresso econômico não pode estar acima da sobrevivência da terra.
Foto de Araquém Alcântara
O que podemos fazer?
Nos informar sobre o que está acontecendo e os efeitos disso. Pensar sempre no longo prazo. Existem maneiras de progredir sem destruir a vida.
Entender que a cidade não é algo isolado do campo e da floresta: os frutos ou os perigos das nossas ações são vividos por todos.
Em casa podemos fazer melhores escolhas de consumo, investir no mundo que queremos ver:
dar preferência a produtores locais que respeitem a terra (como orgânicos)
procurar reduzir o consumo de produtos de origem animal
pesquisar as práticas das empresas e escolher bem os nossos fornecedores (agropecuária é a maior causa de desmatamento, entre abertura de pastos e abertura de terreno para monocultura para ração animal)
usar as ferramentas que temos na democracia para sermos ouvidos pelas nossas lideranças
abrir o diálogo dentro das nossas redes
Não existe planeta B, não existe crescimento econômico que possa ser usado para sustentar a vida sem ar, água ou animais. O futuro do planeta depende de que repensemos a forma que produzimos e consumimos, e quais nossas prioridades. Anoiteceu, é tempo de acordar.